Óleos de canábis ilegais vendidos como souvenirs

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Comercialização de alimentos com canabidiol (CBD) é proibida, mas empresas mudam os rótulos para contornar a lei.

Os óleos com canabidiol (CBD), um componente químico da canábis que não provoca efeitos psicoativos nem dependência, estão à venda por todo o lado para serem consumidos como suplementos alimentares, mas com uma rotulagem que diz o contrário para contornar as limitações legais. “Souvenirs”, artigo de decoração ou de coleção, produto aromático, não ingerir ou inalar são indicações que surgem nas embalagens dos frascos que, no entanto, trazem pipetas para administração de gotas na boca ou inalar.

As autoridades portuguesas garantem que é ilegal, os comerciantes de cânhamo discordam. Certo é que a legislação é difusa e há diferentes interpretações. Enquanto isso, o negócio cresce na rua e na internet e o novo consumidor fica perdido. O Observatório Português de Canábis Medicinal pede mais controlo da Direção-Geral da Alimentação e Veterinária, para que seja realmente identificado o fim a que se destinam estes produtos. A Autoridade de Segurança Económica e Alimentar (ASAE) tem feito algumas apreensões, mas está longe de ter o mercado controlado.

Em modelos de franchising, as lojas de produtos à base de canábis florescem pelo país fora – já serão mais de cem, nas contas de quem está no terreno. E na internet há milhares de ofertas para óleos e outros produtos alimentares com CBD, como chocolates, chás, gomas ou rebuçados. Uma tendência que resulta de uma procura crescente por este canabinóide, que tem vindo a ganhar fama pelos seus alegados benefícios no controlo do stress e da ansiedade, na regulação do sono e em diferentes patologias.

Numa loja de produtos de canábis no Porto, a vendedora explicou ao JN que os óleos de CBD são para consumir e têm diferentes indicações.

Aqueles que têm maior concentração de CBD (a partir de 20%) são procurados para “pessoas com autismo” e os produtos com menor concentração são para uso veterinário, informou. O que está no rótulo – “objeto decorativo, de coleção ou lembrança” – tem a ver com a legislação, “mas é tudo legal, pode ser tomado sem problema”, garantiu.

De facto, o CBD tem sido estudado para o tratamento de algumas doenças, como a epilepsia, e já há fármacos com este componente disponíveis em vários países. O que a maioria dos estados, incluindo Portugal, não permite é que o CBD seja vendido como suplemento alimentar ou qualquer outro produto alimentício.

Em resposta ao JN, o Ministério da Agricultura esclareceu que “o CBD é enquadrado como um novo alimento”, no âmbito do regulamento europeu 2015/ 2283. Como tal, “só poderá ser colocado no mercado após passar por um procedimento de autorização e constar da Lista da União dos Novos Alimentos Autorizados”.

Em suma, “o CBD não consta da referida lista, pelo que não pode, legalmente, ser colocado à venda enquanto género alimentício”. Ou seja, todos os óleos de CBD, os chocolates, as bolachas, os chás, as gomas e as pastilhas elásticas que alegam ter CBD e que se encontram à venda são ilegais, indica a tutela.

NENHUMA AVALIAÇÃO TERMINADA

O Ministério da Agricultura adianta que, até à data, “já foram submetidos à Comissão Europeia mais de 100 processos para autorização, sendo que ainda não há nenhuma avaliação finalizada pela Autoridade Europeia da Segurança dos Alimentos (EFSA)”.

Os representantes dos comerciantes e produtores do cânhamo industrial não concordam com a interpretação legal que está a ser feita e asseguram que não está em conformidade com a legislação europeia.

“Na forma de alimento, suplemento alimentar e cosmético, qualquer cidadão pode ter acesso a extrato de cânhamo industrial que pode ter uma determinada concentração de CBD, mas nunca como componente principal”, assegura Humberto Costa, vice-presidente da Associação de Comerciantes de Cânhamo Industrial, alegando que o catálogo dos novos alimentos é apenas um guia de orientação e não uma lei, como está a ser assumido. João Costa, presidente da CannaCasa – Associação de Cânhamo Industrial, entende que este é um produto agrícola autorizado na União Europeia, pelo que os produtos que advêm da planta são legais. E, por isso, o óleo de cânhamo industrial, que contém CBD e THC (inferior a 0,2%) e que é feito a partir da planta Cannabis sativa L. inteira, pode ser vendido. A interpretação das autoridades é diferente.

A ASAE diz que partes da planta, como as flores e as folhas, bem como extratos de qualquer parte da Cannabis sativa L. ou alimentos aos quais tiverem sido adicionados essas partes ou extratos são novos alimentos e precisam da autorização da EFSA.

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Jornalista: Inês Schreck | ines@jn.pt

Fonte: Jornal de Notícias

Artigo Original: Óleos de canábis ilegais vendidos como ″souvenirs″ (jn.pt)